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Presidente da APS diz ‘ser razoável’ deixar atuais operadores disputarem Tecon 10 na etapa inicial

Fonte: Agência iNFRA
 
O diretor-presidente da APS (Autoridade Portuária de Santos), Anderson Pomini, avalia como “razoável” a opção de liberar empresas que já operam no Porto de Santos a participarem do leilão do Tecon 10 logo na primeira etapa do certame –com a condição de se desfazerem de seus ativos atuais, caso levem o projeto do megaterminal de contêineres. 
 
Pomini comanda o porto onde o ativo será instalado, com previsão de investimentos na ordem de R$ 5,6 bilhões. Além disso, a autoridade portuária vai receber parte da outorga que a empresa vencedora vai pagar para operar o terminal. No modelo formatado pela ANTAQ (Agência Nacional de Transportes Aquaviários), os operadores que estão no porto só poderão entrar na concorrência se a primeira etapa for deserta. 
 
Em entrevista à Agência iNFRA, Pomini classificou a alternativa do órgão regulador também como válida, considerando o temor de concentração de mercado. Por outro lado, avaliou que há uma tendência no mundo jurídico pela via menos restritiva, indicando que será necessário esperar decisões do TCU (Tribunal de Contas da União), onde o projeto aguarda aval, e do Judiciário, uma vez que já houve contestação na esfera judicial. 
 
“Pelo princípio da isonomia, já que tem esse entendimento [de desinvestimento em caso de vitória], por que já não libera na primeira fase também e deixa o mercado concorrer?”, assinalou o executivo.
 
Pomini projeta que um leilão aberto possa render uma outorga de pelo menos R$ 3 bilhões. O valor, em sua estimativa, cairia para entre R$ 1,5 bilhão e R$ 2 bilhões com o modelo aprovado pela ANTAQ. “A análise fria que estou fazendo, pensando no porto, é: quanto mais, melhor. Se eu tiver dez pessoas na mesa fazendo leilão, o pessoal se entusiasma e a outorga é excelente”, disse. 
 
Ele contou esperar para julho uma decisão do MPor (Ministério de Portos e Aeroportos) sobre o aumento da poligonal do Porto de Santos de 7,8 milhões de metros quadrados para 20 milhões de metros quadrados. “Estamos pensando um porto 20 anos à frente”, disse o presidente. 
 
Para ele, é “exagerada” a avaliação de que a situação de Santos beira o colapso. O cenário crítico foi ilustrado recentemente pelo Centronave, entidade que representa empresas de navegação –entre elas, grandes armadores que ficarão de fora da primeira etapa do leilão do Tecon 10, se o modelo escolhido for o da ANTAQ.
 
“O cenário é absolutamente promissor […] Essas mesmas empresas que criticam a letargia do poder público foram as empresas que financiaram a tese da privatização. O porto ficou parado cinco anos por conta desse discurso”, disse Pomini, apresentando detalhes sobre as obras de dragagem previstas (reportagem em texto nesta edição). Confira aqui os principais trechos da entrevista:
 
Agência iNFRA: Qual é a sua avaliação sobre o projeto do Tecon 10, incluindo as restrições concorrenciais que foram colocadas pela ANTAQ? No passado, a APS defendeu o adensamento como opção ao leilão. Qual é a a posição hoje?
 
Anderson Pomini: Há dois anos, em estudo preliminar, chegamos à conclusão de que seria mais rápido atendermos à demanda do porto com propostas de adensamentos. Era nossa defesa. O assunto foi a Brasília, envolveu Casa Civil, Ministério [de Portos e Aeroportos], ANTAQ, TCU. Por isso, tanta demora. É o nosso modelo de democracia. Chegou um certo momento em que a decisão coletiva foi de leilão do Tecon 10. Voltamos à prancheta, readaptamos as nossas ações e retomamos, então, o projeto de leilão daquela área. A ANTAQ faz a calibragem, principalmente enfrentando esse tema se pode ou não pode armador que opera em Santos. E é o que eu penso: quanto maior a participação, maior a possibilidade de outorga. Então, se tiver cinco, seis participantes, certamente tem mais concorrência, o leilão fica mais aquecido e a gente espera maior outorga. Para o porto, é o mais importante. Mas claro que quem analisa o aspecto regulatório, a concentração de mercado, é a ANTAQ. E ela tem um entendimento que me parece razoável. Claro que não agrada aos armadores que atuam no Porto de Santos. 
 
O que espera da avaliação pelo TCU?
 
O TCU fará análise do aspecto regulatório formal, jurídico. Vai estudar os precedentes. Estou conversando com alguns técnicos, com ministros do TCU. Porque a tendência do mundo jurídico, e essa é a cabeça do Tribunal de Contas, é aplicar as regras constitucionais, ou seja, a isonomia. Já ouvi várias teses. Primeiro, é natural que haja restrições para evitar concentração do mercado. Tem vários precedentes no próprio Porto de Santos, mas eu já ouvi também teses do princípio da isonomia. Leva em consideração que a navegação é mundial e não local. Aguardamos os entendimentos do Tribunal. 
 
O TCU julgou recentemente um caso em que afirmou que, para impor uma restrição, antes a ANTAQ precisaria ouvir o Cade. Nas suas conversas, já ouviu algo sobre esse envolvimento do órgão antitruste?
 
Eu penso que o Cade será ouvido e provocado em algum momento, ou pelo próprio Tribunal de Contas da União ou pelo próprio mercado. O mercado interessado, principalmente a Maersk, está lutando para participar da primeira fase, e não só da repescagem. E é um direito dela. E o Cade aplica os princípios também gerais do direito de concentração do mercado. O que é concentração do mercado? Eu te dou dez versões sobre concentração de mercado diferentes, a depender da carga. 
 
E as preocupações que fizeram a APS defender o adensamento inicialmente já foram superadas?
 
O adensamento estava casado com as obras de acesso. Quando a gente decidiu em conjunto pela realização do leilão, imediatamente teve que revisitar a programação para as obras de acesso, principalmente da margem direita. O que nós fizemos? Eu tenho dois viadutos previstos para que sejam construídos em três anos, fruto de acordo feito entre porto, Governo do Estado, Ecorodovias e FIPS [Ferrovia Interna do Porto de Santos]. A Ecorodovias já tem o projeto desses dois viadutos. Tem canteiro de obra na curva do Alemoa, que viabiliza a construção dos dois viadutos. E atrás da BTP tem uma área muito importante, que faremos um chamamento em julho para a instalação de um condomínio logístico retroportuário. Esse condomínio vai contar com vários pisos. Vou ter até a possibilidade de trabalhar com contêineres nessa retroárea, pensando justamente na área do Tecon 10. E ainda tem o túnel Santos-Guarujá e uma obra de três quilômetros da segunda fase do perimetral do Guarujá, que publico edital em julho.
 
Acha possível realizar o leilão do Tecon 10 ainda neste ano?
 
Mesmo com tudo isso, impugnações, TCU, judicialização, eu acredito que aconteça esse ano ainda, lá por novembro. É extremamente importante para o porto, porque, realmente, a gente tem um gargalo. O gargalo não é da forma como o mercado vende. Mas isso é do mercado, é absolutamente natural e até bom, porque também força o poder público a agir e a planejar um pouco melhor para o futuro. 
 
Ainda no ponto da questão concorrencial, você comentou que, quanto mais concorrência maior possibilidade de outorga. Os estudos da ANTAQ chegaram a sugerir que o leilão permitisse a entrada de quem opera em Santos já de largada, desinvestindo se vencer. Como vê essa alternativa?
 
Vivemos um momento jurídico no país em que eu lhe entrego uma decisão, aliás, várias decisões para o mesmo fato. Tudo depende da interpretação. A pergunta que se coloca, principalmente, é: se a gente autorizar os armadores que atuam no Porto de Santos a participarem do leilão, nós estaremos afrontando os princípios que protegem a chamada concentração de mercado ou não? A análise fria que eu estou fazendo, pensando no porto, é: quanto mais, melhor. Se eu tiver dez pessoas na mesa fazendo leilão, o pessoal se entusiasma, vai levantando as plaquinhas e a outorga para o porto é excelente. Eu defendo isso para o porto. Agora, pensando no Brasil, pensando na indústria nacional, pensando na possibilidade de incentivarmos novos players do mercado, que é a tese que evita a concentração de mercado, eu confesso que eu tenho dúvidas.
 
Por quê?
 
Eu precisaria de números para entender. Por exemplo, eu não tenho isso muito depurado, porque eu precisaria levar em consideração as outras operações, por exemplo, da Maersk no Brasil, as outras operações da própria MSC no Brasil, dos outros concorrentes. Quais são? Só vamos ter certeza quando da apresentação da proposta, mas eu ouço dizer, por exemplo, que tem chineses interessados, que tem brasileiros interessados, que tem dinamarqueses, suíços, italianos e tal. Até agora é tudo prospecção. Aí, agora, falando mais como advogado e não como dirigente de porto, a tendência do aspecto regulatório, hoje, é a liberação e a participação de todos no mercado, ainda que num segundo momento, que foi a solução da ANTAQ. Agora, eu pergunto: a gente não poderia já autorizar desde o início e impor a condição de a empresa vencedora abrir mão, por exemplo, caso venha a vencer? Porque isso estimula, inclusive, a participação. Eu acho que seria algo razoável já desde o início, e não na segunda fase. Porque se eu sou a empresa e estou com restrição, vou tentar manobrar, e é lícito que se faça isso, para que o primeiro [leilão] dê deserto para forçar a segunda. Pelo princípio da isonomia, já que tem esse entendimento, por que já não libera na primeira fase também e deixa o mercado concorrer? Eu acho que essa é uma tendência. Vamos ver o que o Tribunal de Contas vai dizer, os outros órgãos, o que o próprio Judiciário vai dizer sobre o assunto. 
 
Trabalham com alguma estimativa de quanto o leilão pode render de outorga?
 
O cenário um, com a participação de todos, eu penso que passa de R$ 3 bilhões de outorga. No cenário dois (modelo da ANTAQ) pode cair para R$ 2 bilhões, R$ 1,5 bilhão. O terminal para qualquer que seja o operador é estratégico. Se nós falarmos em R$ 3 bilhões para essas empresas, está muito bem pago. Eu acho que se tivesse já a decisão de que essa concorrência seria aberta, eu partiria de R$ 3 bilhões. 
 
Sobre as condições atuais do porto: recentemente, falamos com o Centronave e eles apontaram um cenário difícil, de quase colapso, falta de berço, falta de calado, falta de espaço de armazenagem. Como avalia?
 
Sempre exagerado. É só analisarmos os números. O Porto de Santos cresce todo ano, com esse desespero do mercado, em média 10% para todas as cargas. O agro, 20%; contêineres 7%, 5%. Eu sei que isso é mais força da economia, porque o Porto de Santos é uma janela que reproduz exatamente a economia. Eu digo com frequência isso a eles. ‘Olha, eu acho que a gente tem que ter uma visão mais otimista do Brasil, porque só a crítica não colabora em nada’. É claro que a gente tem muito o que fazer, e a gente poderia estar muito melhor se nós tivéssemos gestões públicas um pouco mais qualificadas no passado, que é o que a gente busca agora. O cenário é absolutamente promissor. Desabafo que é importante: essas mesmas empresas que criticam a letargia do poder público foram as empresas que financiaram a tese da privatização. O porto ficou parado cinco anos por conta desse discurso.
 
Como está o processo do aumento da poligonal do porto?
 
Propusemos agora ao Ministério [de Portos e Aeroportos] uma ampliação de área do porto de 7,8 milhões de metros quadrados para 20 milhões de metros quadrados. Ou seja, estamos pensando um porto 20 anos à frente. Então, esperamos o reconhecimento também do Centronave sobre isso. Nós estamos respondendo às últimas diligências. A tendência é, em julho,  o ministro decretar ou total, ou parcial. Ele pode fasear também. São várias áreas: Vila dos Criadores, o Ecopátio, que passará à poligonal do porto; em São Vicente, cinco milhões de metros quadrados. A gente está planejando o porto olhando para o futuro, que é o porto que a gente precisa daqui a 20 anos […] Essas obras todas [túnel, obra da perimetral], em três anos e meio, nos entregarão um novo porto. E aí eu quero ver o Centronave falando assim: “Olha, parabéns, vocês fizeram um bom trabalho”. Nada. Daqui a três anos e meio: ‘já deveriam ter feito isso há 50 anos, isso é um absurdo, o porto vai parar’. Aí olha para o gráfico das empresas que estão no Centronave, o faturamento delas. Mesmo com um porto tão precário, todos os anos [ele] cresce 30%, 40% no faturamento. É essa análise que a gente tem que fazer em conjunto: se fosse tão ruim, eles não estariam operando aqui no Porto de Santos.
 

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