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Dando um tempo

Fonte: O Globo

Do cafezinho às redes sociais: como as pausas ao longo do dia afetam nossa rotina de trabalho
 
Vamos tomar um cafezinho? Praticamente todos os trabalhadores brasileiros já foram convidados para uma pausa ao longo do dia. Mas não é só o café. Com o fim dos fumódromos, o deslocamento dos profissionais aumentou o tempo gasto com cigarro. E as redes sociais se tornaram uma distração difícil de conter no dia a dia. Hoje, enquanto as empresas se preocupam com as pausas, principalmente devido às checagens de mensagens eletrônicas e afins, especialistas dizem que intervalos em que as pessoas realmente relaxam são saudáveis e podem aumentar a produtividade.
 
Liliane Toledo, professora de psicologia do trabalho na Universidade Mackensie, afirma que estes intervalos são uma necessidade biológica. Mas diz que é preciso observar excessos.
 
— Nenhum ser humano fica concentrado as oito horas diárias de trabalho. Vários pesquisadores comprovam que estes espaços são fundamentais para nossa saúde mental. Além disso, são momentos de criar laços sociais... Agora, muita gente acaba usando a pausa para acessar redes sociais e mexer no celular. Neste caso, o intervalo, além de não promover a sociabilização nem refrescar a cabeça, continua a estimular o cérebro, ao invés de relaxá-lo.
 
90% TÊM CONTA EM PELO MENOS UMA REDE SOCIAL
 
Os benefícios na produtividade foram notados pela empresa Ancar Ivanhoe, que passou a estimular as pausas, construindo espaços exatamente para este fim. Segundo Léia Cardoso, gerente de Recursos Humanos da companhia, os momentos são importantes por estimular o funcionário, que se sente mais valorizado. Na empresa, os funcionários têm acesso às redes.
 
— Não tenho dúvidas que houve aumento na produtividade depois que começamos a estimular estes breaks. A pressão do mercado é muito grande, as pessoas estão trabalhando muito, dando 120%. É fundamental que o funcionário se sinta tranquilo, estimulado e seguro para trabalhar.
 
Porém, o uso excessivo das redes sociais e da internet tem se mostrado preocupante, alertam especialistas. Segundo outro estudo da Robert Half, feito apenas com gestores, o principal motivo de desconcentração (30%) no ambiente de trabalho é o acesso à internet — pelo celular ou computador — para fins pessoais, incluindo o uso das redes sociais.
 
E conectar-se ao celular é quase sinônimo de tempo gasto nas redes, registra pesquisa da agência eLife: 77% das pessoas com internet móvel têm como principal atividade visitar estas páginas e, dos brasileiros conectados, mais de 90% estão em pelo menos uma rede social.
 
Mas restringir completamente o acesso pode passar a imagem de falta de confiança em relação ao empregado, afirma Fabio Porto d’Ave, gerente de Divisão da Robert Half. Segundo o especialista, proibir é opção apenas se o gestor notar que os funcionários estão abusando:
 
— O melhor jeito de analisar o uso é calcular o resultado do trabalho. Se o funcionário consegue entregar o que é pedido, com qualidade e dentro dos prazos, a probabilidade é de que ele esteja usando as pausas com bom senso.
 
A consultoria Deep fez uma pesquisa com um grupo de 12 profissionais, acompanhando sua rotina de trabalho durante seis meses, para entender como se dá o uso das redes sociais. O que se viu, segundo Juliana Almeida, diretora do Departamento de Pessoas da companhia, foi perda de foco e até desmotivação pelo uso excessivo de celulares e acesso às redes. Segundo ela, muitas pessoas param para responder, atender ou olhar mensagens assim que as recebem, interrompendo o fluxo de trabalho. Em média, perderiam uma hora e 16 minutos por dia. Por mês, 25 horas ou três dias. O valor perdido poderia chegar a R$ 4.523 anuais por funcionário.
 
— A internet ajuda em muitos sentidos, mas as pessoas estão com problemas de abdicar da ferramenta, nem que seja por algumas horas, o que é muito preocupante e um desafio grande para as empresas atualmente. Proibir é muito difícil, mas é preciso que as empresas se comuniquem com seus funcionários e os conscientizem melhor sobre o uso do celular e da internet — diz a diretora da Deep.
 
Mas não só de problemas vivem as redes sociais. Especialistas concordam que a ferramenta pode ser um importante aliado na busca por informações, contatos e até na resolução de problemas relativos aos trabalho. Sendo assim, para Juliana, proibir o acesso às redes e ao celular é quase impossível. E os maiores malefícios do uso excessivo ficam para os funcionários:
 
— Os gastos prejudicam, mas acabam diluídos nas empresas. As redes sociais podem ser muito úteis no ambiente profissional, mas quando o colaborador troca suas pausas pelo acesso ao celular, ou quando utiliza as redes de forma exagerada, ele perde a concentração, fica muito mais ansioso e se desmotiva.
 
MUITO ALÉM DO CAFEZINHO
 
Uma das pausas mais tradicionais é a saída para fumar um cigarro. E apesar do número de fumantes estar diminuindo e o fim dos fumódromos dificultar a vida do trabalhador que ainda mantém o hábito, as empresas já fazem contas das perdas de produtividade que os fumantes podem gerar.
 
Segundo um levantamento de Marcelo Maron, diretor-executivo do Grupo PAR — que reúne corretoras e faz a gestão de planos de saúde corporativos — um funcionário fumante poderia desperdiçar até 20% do seu dia de trabalho, o equivalente a um quinto da jornada. Assim, para uma empresa que tivesse 20 fumantes em seu quadro funcional, todos com salários de R$ 5,4 mil (já incluídos os encargos e benefícios), o custo anual ultrapassaria R$ 259 mil. Valores assim, segundo Maron, estariam levando empresas a deixarem de contratar fumantes:
 
— Se existe empate, considerando bagagem acadêmica e experiência, o candidato fumante tende a ser eliminado do processo, embora muitas empresas se neguem a admitir.
 
Professora do Ibmec/Rio e sócia-diretora da Yluminarh, Ylana Miller discorda que fumantes produzam menos em função do desperdício de tempo com o vício. Mas explica que os hábitos dos profissionais têm realmente sido avaliados em processos seletivos e os candidatos que priorizam uma vida mais saudável costumam ter a preferência das empresas.
 
— As pausas podem ser feitas por diversos fins, não apenas para o cigarro. Há empresas que, inclusive, estimulam isso, ao criar momentos de sociabilização, que podem ser saudáveis.
 
Uma das pausas é a tradicional conversa com colegas no corredor. Pesquisa da Robert Half, feita apenas com gestores, revela que este é um dos principais momentos de intervalo dos funcionários no ambiente de trabalho: 27% relataram que seus empregados usam parte do tempo para se sociabilizar com os amigos.
 
Marco Tulio Zanini, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV/Rio), acredita que, pelo menos no Brasil, o companheirismo entre os trabalhadores pode beneficiar as empresas:
 
— A sociabilização é muito importante na nossa cultura, somos pessoas que precisam de relacionamentos para nos sentirmos seguros em algum ambiente. E confiança é fundamental para se produzir mais e melhor. É diferente de um trabalhador americano, por exemplo, que preza mais a individualidade.
 
E foi pensando nestes benefícios que a livraria on-line Estante Virtual criou um espaço para que, na hora de tomar o cafezinho, os funcionários pudessem interagir ainda mais. É o que conta Carolina Reis, gerente de Recursos Humanos (RH) da companhia.
 
— Nós queríamos inovar, ir além do café. Então, preparamos uma sala, onde colocamos frutas para que os funcionários possam fazer outros lanches, sucos e interagir. Estas pausas deixam o ambiente mais leve e o sentimento de amizade entre a equipe fortalece a equipe como um todo — conta Carolina, acrescentando que, além de tudo, a empresa considera que essas medidas aumentam a produtividade. — Nós sempre temos prazos apertados e projetos que geram muita pressão. Os momentos de descanso e interatividade são importantes.
 
As frutas da empresa até podem fazer sucesso, mas o café continua a deter a preferência nacional: 81% dos brasileiros consomem a bebida de duas a três vezes ao dia, segundo pesquisa da Robert Half. Inclusive aos finais de semana.
 

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