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11/01/2019 - 01h44

Barrocal pega Nardes e Temer no Porto de Santos (de novo)!


Fonte: Conversa Afiada
 
Por que Nardes visitou JB no dia em que o Porto venceu a Libra?
 
Jair Bolsonaro recebeu nesta segunda-feira 7 a visita de Augusto Nardes, seu ex-colega de partido e de Câmara e atual ministro do Tribunal de Contas da União (TCU). Terá sido coincidência o encontro ocorrer bem no dia em que o Porto de Santos ganhava uma bilionária disputa contra uma financiadora do antecessor de Bolsonaro, Michel Temer, e de um aliado ideológico do presidente-capitão, o ex-deputado Eduardo Cunha?
 
Pois é, após mais de um de uma batalha longe da Justiça, o Porto derrotou a empresa Libra no tribunal arbitral da Câmara de Comércio Brasil-Canadá. Cobrava 2,7 bilhões de reais. O valor exato a receber ainda será calculado e apontado em uma sentença definitiva dos árbitros-juízes, que por ora emitiram uma parcial.
 
E o que Nardes tem a ver com isso? O contrato da Libra com o Porto que deu origem à disputa foi anulado pelo TCU em maio de 2018. Se dependesse de Nardes, não seria. Como relator inicial do caso, ele sentou em cima do processo. Chegou a rejeitar uma recomendação da área técnica do TCU para cancelar o contrato. Não tinha pressa. Queria dar tempo à Libra para se defender.
 
O caso só andou no TCU depois que Nardes desistiu da relatoria, em fevereiro de 2018, sob a alegação de motivos de foro íntimo, sem explicar quais e por que não os tinha manifestado antes.
 
E o que Bolsonaro tem a ver com a história? O TCU mandou o governo fazer uma licitação para definir quem ocupará a área hoje controlada por Libra no Porto de Santos, um órgão estatal federal. A área terá de ser assumida por outro controlador até maio de 2020. A nova licitação caberá ao governo Bolsonaro.
 
Será também na gestão do ex-capitão que o Porto terá de fazer o milagre de receber um caminhão de dinheiro devido por uma empresa dona de finanças críticas. Libra está em recuperação judicial desde julho de 2018. Quando uma firma está nessa situação, há uma hierarquia de qual credor recebe antes e tentativas de reduzir débitos, para salvar o negócio.
 
“A recuperação judicial, portanto, blinda integralmente a nossa operação de qualquer cobrança ou medida que possa afetar negativamente o atendimento a armadores e demais clientes”, diz o balanço do segundo trimestre de 2018 da Libra.
 
“A recuperação foi uma ducha fria na gente”, conta um advogado que enfrenta a Libra na arbitragem. Ele prognostica um papagaio de cerca de 3 bilhões de reais para a empresa pagar, quando sair a sentença definitiva.
 
Na sentença parcial, o Porto de Santos ganhou praticamente tudo. Das nove alegações de Libra, oito foram rejeitadas por unanimidade. Das sete do Porto, cinco foram acolhidas na íntegra por unanimidade e uma foi acolhida de forma parcial. As duas alegações da União, que estava na disputa ao lado do Porto, também foram acolhidas unanimemente.
 
É o começo do fim de uma história de 20 anos e que teve capítulos picantes no primeiro governo Dilma Rousseff a juntar Michel Temer, então vice “decorativo”, e Eduardo Cunha, então líder do PMDB na Câmara. Se o Porto de Santos – os cofres públicos, portanto – não receberem um tostão da Libra, apesar da vitória arbitral, terá sido obra de Temer-Cunha, dupla financiada pela devedora.
 
O contrato de Libra com o Porto de Santos objeto da disputa arbitral é de 1998. Por este contrato, Libra pagaria pelo direito de explorar comercialmente uma área no Porto. Na época, o Porto era comandado por um apadrinhado de Temer, Marcelo Azeredo.
 
De cara, Libra passou a contestar certas coisas que estavam no edital e que o Porto não teria cumprido ao entregar-lhe a área para uso. Parou de pagar as prestações devidas pelo uso e foi à Justiça.
 
Perdeu na primeira instância em 2004, uma sentença da juíza Alessandra Nuyens Aguiar Aranha, da 4a Vara Federal de Santos. Na segunda instância, o Tribunal Regional Federal da 3a Região (TRF3), teve o voto contrário do relator, Wilson Zauhy, e do juiz Silva Neto. O terceiro e último votante, Márcio Moraes, pediu vistas. E aí aconteceu algo estranho.
 
Seis dias depois, o Diário Oficial do TRF3 publicou o resumo do julgamento, a chamada “tira”, como se o assunto estivesse encerrado. Libra aproveitou o engano – foi engano? – e pediu a suspeição de Zauhy, que aceitou. E o Porto de Santos? Nada de recorrer, para inconformismo de um advogado familiarizado com o rolo.
 
Em dezembro de 2012, Dilma Rousseff baixou uma medida provisória (MP) com uma nova Lei de Portos. Esta determinava que empresa portuária caloteira do setor público não poderia ter contrato com órgão público. Atingia Libra em cheio.
 
Durante a votação da MP na Câmara em 2013, Cunha e Temer se uniram e derrotaram Dilma. O texto foi alterado para permitir contratos de caloteiros, caso estes levassem a disputa financeira para uma decisão arbitral, ou seja, para longe de juízes.
 
Na eleição de 2014, Temer e Cunha receberam grana de campanha dos donos de Libra, a família Torrealba. A matriarca Zuleika Torrealba deu 1 milhão de reais à direção do MDB, comandada então por Temer. Filhos dela, os irmãos Rodrigo, Ana Carolina e Celina deram quase 1 milhão de reais a Temer, que abrira uma conta eleitoral própria, distinta da de Dilma.
 
Outros 750 mil foram repassados pelos Torrealba ao MDB do Rio, o de Cunha.
 
As doações e a defesa de interesses de Libra dentro do governo por Temer custaram a prisão dos quatro irmãos Torrealba (o último é Gonçalo) pela Polícia Federal em de março de 2018, na Operação Skala. Zuleika não foi levada devido à idade octogenária. Os irmãos foram soltos dias depois.
 
Registre-se que o relacionamento financeiro de Temer com o pessoal de Libra era antigo. Em 1998, ano do contrato da empresa com o Porto de Santos, Libra repassou dinheiro de propina a Temer e a Marcelo Azeredo, então presidente do Porto. É o que aponta uma planilha surgida em uma disputa judicial matrimonial de Azeredo. A planilha foi ressuscitada pela PF na Operação Skala.
 
Pavimentado o caminho, na lei de 2013, para a arbitragem Libra-Santos, faltava ainda o governo assinar um acordo com a empresa para esta salvar os negócios no Porto e para os processos judiciais existentes entre as partes serem extintos.
 
Na montagem do ministério do segundo mandato de Dilma, Temer reivindicou a pasta dos Portos ao MDB. Caberia a esta pasta assinar o acordo com Libra. Temer foi atendido e botou no cargo um aliado, o ex-deputado Edinho Araújo, atual prefeito de São José do Rio Preto, no interior paulista.
 
Em setembro de 2015, Araújo assinava o acordo com Libra para levar as divergências entre a empresa e o Porto para uma arbitragem, ao mesmo tempo em que os contratos de Libra em Santos eram prorrogados até 2035. A financiadora de Temer e Cunha estava salva. Dias depois, Araújo deixou o cargo, e passou a trabalhar juntamente com Temer pelo impeachment de Dilma.
 
A renovação do contrato de Libra com o Porto, assinado ao mesmo tempo do acordo da arbitragem, foi anulada em maio de 2018 pelo TCU. O órgão merece palmas? Negativo.
 
Aparentemente, não viu nada de errado na época da prorrogação do contrato. Abriu um processo sobre o assunto apenas em 23 de agosto de 2016, três semanas após CartaCapital publicar uma reportagem reveladora das conexões políticas e financeiras entre Temer, Cunha, MDB, Libra, arbitragem etc.
 
Quando Nardes desistiu do caso após vários meses sentado em cima dele, quem assumiu a relatoria foi Ana Arraes, e esta puxou no plenário do TCU a proposta de desfazer o contrato de Libra em Santos. Para Ana, o governo não poderia ter prorrogado o contrato de Libra antes da arbitragem. Só depois, pois o valor da caução seria fixado no tribunal arbitral.
 
Recorde-se: renovação e acordo da arbitragem foram assinados simultaneamente.
 
A visão de Ana Arraes foi partilhada pelo representante do Ministério Público no TCU. Em um parecer de abril de 2018, Julio Marcelo de Oliveira disse que Libra “atuou, com a conivência do poder público, de modo a inverter a lógica da lei”, e que o governo “se despiu de todas as suas prerrogativas e responsabilidades para atender de modo servil aos interesses” da empresa.
 
Ele e o MP não viram isso antes? Não tiveram interesse em examinar o acordo de 2 de setembro de 2015? Em outubro de 2015, uma parceria entre Augusto Nardes e Julio Marcelo levou o TCU a condenar Dilma por “pedalada fiscal”, conceito que levaria à degola da petista meses depois.
 
E aí quem assumiu o poder foi Temer. Que agora foi sucedido por Bolsonaro. Que agora recebe Nardes no Palácio do Planalto no dia em que Libra foi derrotada pela Companha Docas do Estado de São Paulo, a Codesp, o nome formal do Porto de Santos.
 
“É incontroverso que Libra deixou de realizar o pagamento da integralidade do preço ajustado durante toda a vigência do Contrato. Para tanto, invocou, em diversas ações judiciais, os alegados descumprimentos de CODESP e as situações de desequilíbrio econômico-financeiro do Contrato”, diz a sentença parcial, obtida por CartaCapital.
 
O tribunal arbitral entendeu, segue a setenção, “que não houve qualquer descumprimento do contrato por parte da Codesp” e “que não se caracterizou o desequilíbrio econômico-financeiro do arrendamento [por Libra da área no Porto de Santos]”.
 
“Sendo assim, afigura-se forçoso reconhecer: (i) a obrigação de Libra de cumprir suas obrigações pecuniárias tal como ajustadas originalmente” e “o inadimplemento da obrigação de pagamento a cargo de Libra.” 
 
Em tempo: Nardes é aquele ministro do tribunal das contas que disse que a Dilma pedalou. É também o que está mais enrolado que o Geddel (até ser preso).