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Será necessário torcer contra o crescimento?

Fonte: A Tribuna On-line / Luiz Cláudio Santana Montenegro*
 
Dados de 2024 são de ocupação superior a 100% do nível mínimo de serviço adequado necessário para operações eficientes
 
Há tempos temos alertado, nesta coluna, sobre o gravíssimo problema de capacidade nos portos brasileiros. Apesar de o problema ser generalizado para praticamente todos os tipos de carga, hoje vamos focar nos contêineres.
 
Terminais portuários, como o próprio nome já carrega a definição, são instalações onde o transporte começa ou termina. Quando tratamos de capacidade em terminais portuários, os reflexos da sua restrição estão obviamente ligados à formação imediata de filas de veículos.
 
As principais referências mundiais sobre o tema da teoria de filas, aplicadas aos portos, mostram que uma utilização superior a 50% da capacidade do cais já significa reflexos imediatos na formação de filas de navios, caminhões e trens.
 
A título de exemplo, o Porto de Santos, que tinha 8,9 horas de fila de navios de contêineres em 2019, já mostrava, naquele momento, uma taxa de utilização superior a 70% da sua capacidade, um indicador claro de problemas à frente.
 
Dizia minha avó que anjo da guarda não diz “Eu te disse!”. Pois, nesse caso, eu, particularmente, tenho trabalhado arduamente há alguns anos na tentativa de demonstrar essa preocupação.
 
Pois o problema chegou e já chegou com muita força. Os dados de 2024 são de terminais do Porto de Santos com ocupação superior a 100% do nível mínimo de serviço adequado necessário para operações eficientes e, consequentemente, as filas já superam 22 horas em média. Esse aumento de filas representa um custo de cerca de R$ 700 milhões por ano no Porto de Santos, só para o custo de espera dos navios de contêineres.
 
Costumo comparar a navegação de afretamento com os serviços de táxi, em que informamos ao motorista onde ele deve nos buscar e onde ele deve nos deixar no destino. No caso da navegação de linha, o serviço funciona de forma mais parecida com um ônibus, em que há uma rota pré-estabelecida e os navios param em terminais nessa rota quando carregam um volume de contêineres e descarregam outro tanto, modelo típico para o transporte de contêineres.
 
Ora, no caso da navegação por afretamento, um porto ou terminal congestionado implicará em revisões contratuais de afretamento e aumento de preços pelo dono do navio.
 
Já no caso da navegação de linha, o problema se revela de forma muito mais grave. Quando um porto chega a uma condição de congestionamento crônica, há uma real possibilidade de que ele se torne um problema muito mais impactante. Isso porque o atraso em um porto gera reflexos de atrasos e prejuízos em toda a rota mundial pré-definida, até que esse custo chega a níveis insustentáveis.
 
O leitor deve estar pensando: “Ah, isso nunca acontecerá no Porto de Santos!”. Pois eu digo, sem medo de errar, que o espectador do Porto de Itajaí também nunca achou que isso aconteceria naquele porto. Pois a realidade cruel é que o Porto de Itajaí, que já foi um dos maiores portos de movimentação de contêineres do País, não movimenta um único contêiner desde o final do ano de 2022.
 
Há uma grande expectativa de crescimento do movimento de contêineres no País, reflexo de um aumento de consumo e um crescimento regular da nossa economia. Esse volume tende a crescer duas a três vezes o índice do PIB nessas situações. Com o gargalo formado, ou veremos filas cada vez maiores de navios e consequências ainda mais desastrosas, como aconteceu em Itajaí, ou então teremos que torcer contra o crescimento, pois estou certo de que o problema em Santos já traz reflexos na inflação do País.
 
Pois minha opção de voto é pelo esforço concentrado na garantia de investimentos imediatos para aumento da capacidade portuária como pauta prioritária de Estado.
 
*Luis Claudio Santana Montenegro, é engenheiro civil e mestre em Engenharia de Transportes pelo Instituto Militar de Engenharia
 

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