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Ataques houthis: crônica de uma tragédia anunciada

Fonte: A Tribuna On-line / Eliane Octaviano Martins*
 
O Mar Vermelho e o Canal de Suez trabalham com apenas 30% da capacidade. Mais transportadores deverão evitar a região
 
Na nossa coluna anterior na editoria Porto & Mar, analisamos os impactos dos ataques dos houthis aos navios mercantes e alertamos para os riscos à segurança da navegação, apontando uma série de questões. Informamos que o navio graneleiro MV Rubymar, de bandeira de Belize e operado por uma empresa libanesa, havia sido atacado pelos rebeldes houthis e naufragado no Mar Vermelho. O incidente marcava o primeiro naufrágio de um navio resultante dos ataques iniciados pelos houthis em novembro de 2023, afetando uma rota crucial para o tráfego marítimo mundial e ainda não se tinha dimensão exata dos efeitos do acidente no contexto ambiental. Indagamos, ao final de nossa coluna, se não estaríamos diante de uma “crônica de uma tragédia anunciada”. Infelizmente, estávamos...
 
O MV Rubymar carregava 21 mil toneladas de fertilizantes à base de fosfato de amônio e sulfato, um material que ameaça a ecologia marinha do Mar Vermelho, em específico os recifes de coral. Além da catástrofe ambiental sem precedentes, o naufrágio também representa um risco de impacto subterrâneo para outros navios que utilizam as rotas marítimas da hidrovia. Porém, o acidente com o MV Rubymar não foi a única tragédia.
 
Poucos dias após o naufrágio do MV Rubymar, o M/V True Confidence, um graneleiro com bandeira de Barbados e propriedade da Libéria, foi atacado pelos houthis com mísseis balísticos. O ataque resultou em três vítimas fatais e quatro tripulantes feridos. O primeiro ataque fatal a um navio comercial no Mar Vermelho desde o início dos ataques dos houthis, no final do ano passado, destaca o complexo desafio de restaurar a segurança da navegação destas rotas comerciais extremamente relevantes para o comercio mundial.
 
Apesar das iniciativas lideradas pelos Estados Unidos, em especial a Operação Guardião da Prosperidade, coalizão defensiva de nações que comprometeram recursos navais para reforçar a segurança no Mar Vermelho e combater os ataques, as ações dos houthis têm se intensificado. A operação vem interceptando inúmeros lançamentos de drones e mísseis a partir de áreas do Iêmen controladas pelos houthi, porém dados estatísticos vêm apontando que os houthis já efetuaram mais de 45 ataques com mísseis e drones contra navios comerciais, da Marinha dos EUA e da coalizão que operam no Mar Vermelho.
 
Estes dois graves incidentes aumentam as tensões e as preocupações com a segurança marítima global, impactando ainda mais o comércio e a economia no Mar Vermelho. Atualmente, o Mar Vermelho e o Canal de Suez trabalham com apenas 30% da capacidade de transporte usual, incluindo os navios de contêineres, graneleiros, navios porta-automóveis e petroleiros que transportam óleo e gás natural. Com a ocorrência destes dois graves incidentes, os desafios econômicos se intensificam e, provavelmente, mais transportadores deverão evitar a região.
 
O desvio de uma das rotas marítimas mais importantes no comércio global de matérias-primas, petróleo e gás e de bens de consumo, que corresponde a algo entre 10% e 15% do comércio mundial e 30% do comércio de contêineres, afetou a cadeia logística e o abastecimento global, aumentando o preço do frete e do seguro marítimo, inclusive com elevação nos prêmios de seguro de risco de guerra e impacto nas entregas de gás natural liquefeito (GNL). Embora especialistas apontem que a crise pode levar muitos meses até que seja resolvida, esperemos que a Operação Guardião da Prosperidade consiga enfrentar a recente escalada de ataques dos houthis e cessar o conflito.
 
*Eliane Octaviano Martins, jurista e diretora da Maritime Law Academy - MLAW
 

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