Artigos e Entrevistas

Planejamento e governança portuários, sub judice?

Fonte: A Tribuna On-line / Frederico Busssinger*
 
Imprensa vem crescentemente trazendo dúvidas e reivindicações relevantes para o futuro dos portos
 
 
Se associado ao avanço do cronograma de desestatização (privatização) de autoridades portuárias, não é possível afirmar. O certo é que a imprensa vem crescentemente trazendo à baila dúvidas e reivindicações relevantes para o futuro dos portos no Programa de Parcerias de Investimento (PPI). Para a logística brasileira, de forma mais ampla.
 
Algumas manchetes de A Tribuna, desta semana, sobre o Porto de Santos, são autoexplicativas: “Setor de líquidos luta por mais berços” (11/JUL); “Agronegócio quer maior espaço para operações no Porto de Santos” (13/JUL); “Acessos preocupam agronegócio” (14/JUL). Nada novo, mas chamam atenção pois o complexo portuário teve seu Plano Mestre atualizado há dois anos, a Poligonal do Porto Organizado, em 30/JUN/20, e seu PDZ (Plano de Desenvolvimento e Zoneamento), há pouco menos de um ano; visando “... proporcionar visões estratégicas e táticas... focando no desenvolvimento ... ao longo dos próximos anos, até 2060, e indicando as ações necessárias...”. Instrumentos de longo prazo teriam se tornado obsoletos em tão pouco tempo?
 
No caso específico da Poligonal, inclusive, há informações que “o Ministério (MINFRA) está avaliando uma ampliação do Porto de Santos...”. Algo nessa linha foi imaginado em 2019, mas acabou não prosperando (VE-28/OUT/19). Se confirmado, obviamente, seria necessária nova revisão da Poligonal.
 
Em “Setor de contêineres quer cabotagem competitiva” (15/JUL), a discussão é ampliada na perspectiva de consolidá-lo como porto concentrador (“hub”), ante a possibilidade, agora, de operação de navios de 366m. Acessos, nova ligação seca, modelagem para desestatização (inclusive para os acessos), liberação alfandegária são arrolados como variáveis relevantes para tanto.
 
Com escopo similar, mas focado na Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa) e nos portos capixabas (processo que está mais adiantado), o artigo “Desestatização, e eu com isso?!” (AT-11/JUL) apresenta uma ampla pauta de dúvidas remanescentes, mesmo após a recente audiência pública e as “210 páginas de respostas às contribuições... que não são suficientes para esclarecer aspectos fundamentais da desestatização em curso”. O artigo termina com um tipo de conclamação ao setor (daí seu título), e merece atenção, seja pelo conteúdo, seja pela autoria: duas profissionais com reconhecida atuação junto ao setor privado.
 
Mas talvez a matéria que tenha causado maior impacto foi “Porto de Santos vê prejuízo de até R$ 5,85 bi com decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) que prorroga contrato de operadora de contêineres” (12/JUL). Ela destaca que, “em maio, o TCU impôs derrota ao Ministério da Infraestrutura (Minfra), por 5 votos a 3...” na decisão sobre a Marimex. Tais valores seriam as “perdas calculadas pela Autoridade Portuária em recurso ao TCU, ao qual O Globo teve acesso”. A matéria chama atenção por: i) uma incomum derrota do Minfra; ii) TCU no papel de determinar/obrigar renovação de contrato (seria esse um “novo normal”?); e iii) montantes bilionários de perdas envolvidos.
 
Duas curiosidades: i) os prejuízos porventura comprovados seriam debitados da contabilidade de investimentos periodicamente divulgados pelo PPI? ii) se confirmados, a quem atribuir a responsabilidade por tais prejuízos? O TCU é imputável?
 
Os fatos noticiados são relevantes e têm várias implicações, inclusive de curto prazo: i) geram incertezas (vírus anti-segurança jurídica e, daí, para atratividade de investimentos); ii) põem em xeque processos de planejamento em curso e planos no seu papel de balizador de longo prazo. E mais grave: nosso próprio modelo de governança portuária.
 
Mas eles revelam, mais que tudo, que reformas portuárias vão além de planilhas, algoritmos e, mesmo, de “ativos”.
 
*Frederico Bussinger, engenheiro, economista e consultor. Foi diretor do Metro/SP, Departamento Hidroviário (SP), e da Codesp. Também foi presidente da SPTrans, CPTM, Docas de São Sebastião e da Confea.
 

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