Artigos e Entrevistas

Os riscos da nova Lei dos Portos

José Augusto Valente (*)



“Não faço o bem que quero, mas o mal que não quero esse faço” (Romanos 7;19)
 
A nova Lei dos Portos (MP-595/12), encaminhada pela presidente Dilma ao Congresso Nacional, anunciada como panaceia para resolver problemas nos portos brasileiros, pode trazer mais males do que benefícios para o nosso comércio exterior.
 
Essa mudança do marco regulatório tem como base um diagnóstico, penso que equivocado, de que os portos dificultam o crescimento das exportações/importações.
 
Fundamento minha discordância em três fatos inquestionáveis, ocorridos entre 2002 e 2011: a) a corrente de comércio exterior brasileiro cresceu de US$ 100 bilhões para US$ 480 bilhões; b) a movimentação de contêineres cresceu de 2 milhões para 5,3 milhões e; c) o Brasil teve crescimento, no comércio exterior, período 2009/2011, maior que a China e muito maior que os Estados Unidos e a Alemanha.
 
É bom lembrar que 95% do comércio exterior brasileiro se dá através dos portos. Ora, se é verdade que um sistema ineficiente e precário pode travar o crescimento do comércio exterior, é tão verdade quanto que o crescimento elevado deste indica que os portos contribuíram para esse sucesso.
 
O marco regulatório anterior (Lei 8.630/93) – agora revogado pela MP-595/12 – é semelhante ao de países desenvolvidos e funcionava bem até agora, o que não quer dizer que prescinda de melhorias, já que qualquer sistema portuário pode e deve ser melhorado, mesmo os europeus e asiáticos.
 
Aqui, de fato, os aspectos que oneram o custo logístico e a operação portuária são: acessos terrestres aos portos; elevada burocracia; tarifas portuárias elevadas, cobradas pelos donos dos navios (armadores) do importador/exportador; e necessidades de ampliação dos berços de atracação e de dragagem, para fazer face aos navios gigantes que começaram a vir para o Brasil.
 
Entretanto, a MP-595/12 não ataca nenhum desses pontos! Ela parte de um outro diagnóstico de que o problema está nos portos públicos e propõe a expansão dos terminais privados que, salvo melhor juízo, é inconstitucional.
 
Abrir a possibilidade desses terminais prestarem serviço público, sem licitação, irá gerar competição injusta entre desiguais: de um lado, os operadores nos portos públicos, com uma série de restrições e encargos provenientes dos processos licitatórios e regras da Antaq e com necessidade de ganhos de escala para reduzir custos e tarifas cobradas dos armadores; do outro lado, os terminais privados, sem restrições, com baixos encargos e poucas obrigações.
 
Nesse cenário, há o risco dos futuros terminais privados ficarem nas mãos dos donos dos navios e dos grandes operadores internacionais, que têm fôlego suficiente para fazer “dumping” por longo tempo, até a total precarização dos portos públicos. Nesse momento, o comércio exterior brasileiro ficará refém de interesses internacionais, com a consequente redução da competitividade dos nossos produtos.
 
Assim, é necessário emendar a MP-595/12, visando a evitar esse risco. O que é possível pois, nas 645 emendas apresentadas, há algumas que poderão cumprir muito bem esse papel. Com a palavra o Congresso Nacional.



 

(*) José Augusto Valente é diretor Executivo do Portal de Logística T1 e ex-secretário de Política Nacional de Transportes  

 


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