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Medida Provisória 595: o Direito Portuário não navega para frente

Míriam Ramoniga (*)

 

O Direito Portuário não se forma simplesmente por meio da edição de uma lei: os valores atribuídos aos fatos que ocorrem são relevantes para sua consolidação

A Medida Provisória (MP) 595 - que de forma simplista revoga a lei nº 8630/93, conhecida como a Lei dos Portos, mas acaba sendo “uma cópia” de seu conteúdo, alterando a numeração dos artigos e modificando algumas palavras - será apreciada pelo Congresso Nacional a partir de fevereiro trazendo uma série de discussões jurídicas e fáticas ao setor.

A tentativa do Estado é apresentar novas regras e programas para baixar custos com serviços portuários, o que, certamente, acarreta reflexos favoráveis, pois o transporte aquaviário é altamente estratégico nas relações comerciais nacionais e internacionais. Entretanto, é fundamental analisá-la do ponto de vista conceitual, pois a regulação, a exploração dos portos e as instalações portuárias devem ser elaboradas e estruturadas de forma coerente com a realidade e a necessidade da sociedade como um todo.

O Direito Portuário não se forma simplesmente por meio da edição de uma lei: os valores atribuídos aos fatos que ocorrem são relevantes para sua consolidação. O contexto à época da concepção da lei nº 8.630/93 era de um momento histórico em que permeava uma política neoliberal, no qual a sociedade tinha a intenção de superar a crise setorial e, assim, romper o monopólio exercido dentro das atividades portuárias.

No que tange ao aspecto social, a Lei dos Portos propiciou o crescimento do mercado e resguardou os direitos da sociedade, do trabalhador, do empresário, entre outros. Foi importante para a busca da participação competitiva no mercado nacional e internacional.

Revogar na íntegra esta lei significa um retrocesso político e legislativo - e em nada traz avanços ou melhorias. Afirmo isso, pois, nem sequer observaram todas as legislações que fazem referência à mesma. Chamo atenção para uma que se refere à previdência, a lei 9.719/98, por exemplo. Ela faz menção aos trabalhadores avulsos, item que a referida MP não contempla em sua “revogação”. Afirma-se que a edição da MP 595/2012 valoriza mais o trabalhador da área, quando descreve em seu artigo 28 inciso III: “Treinar e habilitar profissionalmente o trabalhador portuário, inscrevendo-o no cadastro”. Mas o que ocorre, na verdade, é apenas uma reedição do conteúdo da legislação em vigor há quase 20 anos. Na Lei dos Portos, em seu artigo 18 inciso III, está “promover o treinamento e a habilitação profissional do trabalhador portuário, inscrevendo-o no cadastro”.

Essa revogação preocupa a maior parte dos empresários e trabalhadores do segmento, já que abriu a possibilidade para a apresentação de emendas em todos os artigos da MP 595, possibilitando a inclusão dos mais variados interesses. Devemos estar atentos para não incorrer na geração de conflitos, disjunções e novas formas de estratificação que venham contra ao desenvolvimento do setor portuário, bem como da economia nacional.

Esta legislação precisa ser harmonizada com a participação da sociedade, objetivando a estabilidade e a segurança jurídica almejada, a fim de garantir, fundamentalmente, a expansão do transporte aquaviário.

 


 

(*) Míriam Ramoniga
Professora do Instituto Nacional de Estudos Jurídicos e Empresariais (Ineje)
   

 


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