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Caos logístico mundial vai pesar no bolso do brasileiro

Fonte: Portos e Navios

 
Falta de contêineres, fretes mais caros, desvalorização da moeda e, para completar o cenário, o encalhe do Ever Given. A conta do caos no setor logístico marítimo mundial, provocada, inicialmente, pela pandemia do coronavírus, vai pesar ainda mais no bolso do brasileiro. Se nos supermercados já é possível constatar aumentos de até 40% em muitos produtos — e a inflação ronda a casa dos 6% —, esse desequilíbrio promete perdurar pelo menos até o quarto trimestre do ano.
 
“O que houve foi uma desconfiguração do comércio mundial”, afirma o presidente-executivo da Associação do Comércio Exterior do Brasil (AEB). “Hoje, faltam navios, faltam contêineres e a moeda brasileira está desvalorizada. É um conjunto de fatores negativos, atingindo diretamente as exportações brasileiras. O frete subiu muito, afetando diretamente as importações e as exportações.”
 
Há múltiplos fatores afetando a logística e encarecendo os produtos. Nos primeiros meses de 2020, a paralisação da indústria em muitos países fez com que navios e contêineres ficassem parados, por falta de cargas para transportar. Em um segundo momento, a economia chinesa retomou suas atividades e, desde então, não para de crescer. Só que, a essa altura, muitas companhias de navegação já haviam diminuído rotas e frequências. Na avaliação de Castro, esse desacerto entre demanda e oferta em diversos setores da cadeia logística prejudica, principalmente, os produtos brasileiros manufaturados.
 
“Se você olha a balança comercial, estamos batendo recordes históricos. Mas não por estarmos vendendo mais e sim por que os preços subiram muito. Em 2020, a soja estava no mercado internacional a US$ 340 a tonelada. Hoje, está a US$ 450 e com tendência de aumentar. Mas vamos exportar as mesmas 85 milhões de toneladas do ano passado”, observa Castro.
 
No caso do petróleo, o volume de exportações deve cair, mas, em compensação, o preço aumento. Sobre o minério de ferro, a principal commodity brasileira, prevê-se um crescimento de vendas para o exterior da ordem de 10%. O preço, porém, aumentou 100%. Em contrapartida, o setor de manufaturados sofre com a falta de insumos.
 
“As montadoras estão com dezenas de carros parados por falta de peças. A situação na Zona Franca de Manaus, que também depende da importação de componentes, é crítica. Vivemos o pior do mundos”, lamenta o o presidente-executivo da Associação do Comércio Exterior do Brasil (AEB).
 
Pior que isso: com a desvalorização do real, abriu-se uma janela de oportunidades para pequenas e médias empresas, em setores como cerâmica, calçados e móveis. E quem disse que os produtores conseguem tirar essas cargas do chão?
 
“O Brasil voltou a estar no foco e há oportunidades, mas só vamos conseguir aproveitar entre 60% e 70% dessa demanda”, diz o diretor de Desenvolvimento de Negócios para América Latina da Rangel Logística, Enrique Garcia. “É muito triste ter que dizer não para um empresário que fechou uma boa venda, mas não consegue entregar por problemas de logística”.
 
Para Garcia, três fatores estão causando o desequilíbrio global no transporte e na logística marítima. O primeiro é a mudança nas formas de consumir produtos e serviços, uma tendência global. O segundo está relacionado ao fato de, na pandemia, a busca por segurança e, portanto, o investimento em moedas fortes, ter causado a desvalorização da moeda de países como Brasil, México e África do Sul. Essa desvalorização, em alguns casos, chegou a 40%. Por fim, tanto a Europa quanto os Estados Unidos ensaiam a retomada de suas atividades, no chamado novo normal. Mas, ao mesmo tempo, muitos países do Hemisfério Sul — o Brasil entre eles — ainda enfrentam uma grave crise sanitária, com elevado número de óbitos e previsões de terceira ou quarto ondas de Covid-19. Em meio a tudo isso, o Ever Given encalhou.
 
“Hoje, você tem mais carga para exportar do que container. Tem menos rotas e menos. Com isso, o preço do frete aumentou muito. Se, ano passado, uma empresa pagava X pelo frete, hoje está pagando 3 X”, diz Garcia. “É consequência desse leilão de encontrar espaço nas embarcações”.
 
Para os exportadores, há outra má notícia. O preço de insumos, como embalagens, aumentou muito, porque está complicadíssimo importar esse tipo de produto. A lei da oferta e da procura está desequilibrada em muitas etapas e, na análise de Garcia, é preciso paciência para o setor voltar a navegar em águas mais calmas.
 
“A pandemia trouxe o que eu chamo de um componente agridoce, Quando você pega produtos com alto valor agregado, a logística influencia menos, na conta final. Mas se você analisa as cargas que dependem de temperatura controlada e têm uma vida útil mais curta, como frutas, legumes e verduras, esse custo faz muita diferença no preço ao consumidor. Agora, teríamos condições de duplicar ou triplicar o volume de exportações, mas não há logística disponível para isso. Acredito que estamos no pico da crise. A normalidade só vai voltar a se reestabelecer, dentro dos novos parâmetros, a partir do quarto trimestre”, diz ele.
 
Em meio ao caos, há espaço para boas notícias. Parceiros fiéis do Brasil e grandes consumidores das comoditties nacionais, os países árabes negociam a instalação de quatro hubs — duas na África e dois na Ásia — para garantir que o fluxo comercial não seja afetado por futuras pandemias. A ideia é ter rotas mais diretas e mais independentes da logística da Europa e que também possam abrir frentes de negócios com países com os quais o Brasil hoje não negocia, como Paquistão, Irã e Afeganistão, entre outros.
 
‘’A ideia é ter uma infiltração maior em países que hoje não fazem parte desse comércio”, explica o secretario geral na Câmara de Comércio Árabe-Brasileira, Tamer Mansour. “Os países árabes sempre sofreram com a falta de rotas exclusivas, já que não temos volumes de compras suficiente para fechar navios inteiros. Estamos dialogando com órgãos públicos e empresas de navegação para mudar isso”
 
Nos cinco primeiros meses do ano, as exportações brasileiras para os países árabes cresceram 19% em receita e 16% em volume. A lista de produtos vai de minério de ferro a papel, passando por soja, milho e, naturalmente, proteínas animais. Em média, as entregas vêm atrasando entre oito e dez dias, por conta do nó na logística mundial. E os exportadores podem se preparar porque com a vacinação adiantada no mundo árabe, a demanda por produtos brasileiros vai crescer.
 
“Em outubro, Dubai vai sediar a Expo 2021, que, provavelmente, será o maior evento presencial pós-pandemia, já que as Olimpíadas de Tóquio não terão público. Evidente que haverá demanda de produtos para os visitantes e para os participantes”, informa Mansour.
 

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