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Cidade precisa ter voz nas decisões do Porto, defende Prefeito de Santos

Fonte: Portogente
 
Maior Porto do Hemisfério Sul completou 129 anos e se prepara para iniciar uma nova relação com a administração municipal eleita em 2020


 
Rogério Santos (PSDB) foi eleito prefeito do município de Santos em 2020 com uma votação incontestável que lhe deu a vitória já em primeiro turno. Graduado e com mestrado em Odontologia, é especialista em saúde pública. Iniciou sua carreira política em 2009 como assessor parlamentar do então deputado estadual Paulo Alexandre Barbosa (PSDB), que ele acompanhou ao ser eleito prefeito de Santos (em dois mandatos entre os anos 2013 e 2020). Na gestão municipal foi chefe de gabinete e, em 2017, Secretário de Governo, onde permaneceu até o início da campanha para as eleições municipais do ano passado.1° de janeiro de 2013 até 31 de dezembro de 2020.
 
A esse conhecimento acumulado sobre a gestão do município, Rogério Santos, que carrega o nome da cidade, fala do porto como um lugar de conexões, encontros, chegadas e afetos. E não estamos falando de qualquer terminal portuário, falamos do maior porto do País e do Hemisfério Sul, o Porto de Santos, que, neste 2 de fevereiro, completou 129 anos.
 
Para ele, na relação porto e cidade, “colaboração” deve ser a palavra-chave: “O porto, sob gestão federal, precisa entender os impactos que traz para o dia a dia dos santistas e a cidade, por sua vez, precisa desenvolver meios sustentáveis para dar suporte ao crescimento da atividade portuária.” Objetivos que envolvem gestão democrática envolvendo a cidadania, o diálogo com a Autoridade Portuária e a promoção de iniciativas que mitiguem os impactos ambientais, patrimoniais, culturais, sociais e que promovam os benefícios econômicos para o conjunto da sociedade são fundamentais, como a geração de postos de trabalho, a pesquisa, o investimento em novas atividades produtivas, a revisão da Lei de Uso e Ocupação do Solo, entre outras demandas.
 
Entre os desafios que coloca para sua gestão está o enfrentamento à pandemia da Covid-19; a busca do equilíbrio ambiental que preserve a natureza, fundamental à indústria do turismo santista; a defesa de investimentos em alternativas que melhorem a mobilidade urbana na Baixada Santista e sua comunicação com o conjunto do País. Por fim, se posiciona, com relação à privatização do Porto, que “é preciso avançar nas discussões para definir a melhor forma para que isso ocorra, sem penalizar o trabalhador portuário e os municípios da Baixada Santista”.
 
Confira a entrevista completa!
 
Portogente - Investido pela autoridade do mandato com uma grande votação, o senhor se sente fortalecido para discutir com profundidade, com outros entes institucionais, a relação que o Porto de Santos tem com a cidade de Santos?
 
Rogério Santos - Eu acredito sempre no diálogo entre a Cidade e o porto. Santos tem sua história relacionada a seu porto. A cidade surgiu e se desenvolveu a partir dele. Foi por aqui que chegaram os imigrantes, que exportamos o Ouro Verde, o café. Foi pelo porto que meu pai veio de Portugal para fazer sua vida aqui, em 1958, e constituir a minha família. Então eu acredito que a relação entre a cidade e o Porto de Santos sempre foi próxima. A cidade precisa ter voz, participação, nas decisões que envolvam o porto. Hoje, creio que haja um único caminho para que ambos se desenvolvam em harmonia: a colaboração. O porto, sob gestão federal, precisa entender os impactos que traz para o dia a dia dos santistas e a cidade, por sua vez, precisa desenvolver meios sustentáveis para dar suporte ao crescimento da atividade portuária. Muito está sendo feito. As obras na Nova Entrada de Santos beneficiam o acesso de caminhões aos terminais portuários, diminuindo o impacto desses veículos sobre o trânsito de Santos.
 
Agora, meu projeto é rever a Lei de Uso e Ocupação do Solo de forma a incentivar a instalação de empresas retroportuárias em condomínios industriais na Alemoa e na Área Continental, gerando mais empregos e renda aos santistas. Todas essas ações incentivam negócios no nosso porto, que é responsável por um terço da balança comercial brasileira e principal empregador de Santos. Essa relação colaborativa também tem sido praticada pela Autoridade Portuária, que está atenta às demandas da Cidade. Recentemente colocou em seu PDZ a mudança do terminal de passageiros para a região do Valongo, o que é de extrema importância para a revitalização do Centro Histórico. Há algum tempo sofríamos com o impacto negativo do escoamento das safras de grãos no sistema viário urbano, mas iniciativas colaborativas com a Autoridade Portuária minimizaram esse impacto.
 
Temos desenvolvido um projeto conversando com vários prefeitos do Brasil, gestores de cidades portuárias, que demostram a importância do porto na garantia de recursos financeiros e o recolhimento de tributos. Como é a realidade de Santos?
 
O porto é o principal empregador de Santos. Ao longo dos últimos anos vem batendo recordes de movimentação. Mas a progressiva, e inevitável, automação das operações traz impactos negativos sobre a Cidade, causando a redução significativa de postos de trabalho. Então é fundamental pensar em meios para que o porto possa gerar mais empregos, e é aqui que entra a mencionada revisão da Lei de Uso e Ocupação do Solo. Trata-se de uma iniciativa que estabeleça áreas e incentivos fiscais para atrair as empresas retro portuárias, como as que produzem tintas para a pintura de embarcações, por exemplo. O desenvolvimento da pesquisa por meio do Parque Tecnológico de Santos, que une empreendedores privados, poder público e universidades da região em um moderno prédio na Vila Nova, também é fundamental para o desenvolvimento de tecnologias e práticas inovadoras para toda a cadeia de logística portuária, incentivando startups e a instalação de empresas complementares aos serviços existentes. Todas essas ações geram emprego e renda para os santistas e trazem investimentos para a Cidade. Outra questão importante é garantir que os recursos obtidos na região, como as outorgas, sejam empregados na infraestrutura portuária. Hoje, ficam com a União. Para isso contamos com o apoio dos deputados da Baixada e com a articulação da nossa secretaria de Assuntos Portuários e Desenvolvimento da Região Central para sensibilizar sobre a importância dos investimentos na infraestrutura portuária. Os terminais portuários também têm contribuído diretamente com a Cidade com a realização dos Trimmcs [Termos de Responsabilidade de Implantação de Medidas Mitigadoras e Compensatórias].
 
Gostaríamos que falasse de como pensa uma relação harmoniosa e não só motivadora de redução dos danos ambientais que essa atividade econômica causa às comunidades. Como o senhor fará uma gestão que envolva os municípios, gestores portuários, sindicatos de trabalhadores amplos setores da sociedade e setores do empresariado que são beneficiários de alguma forma da cadeia produtiva portuária. Isso envolve a questão da Covid-19 e o porto como porta de entrada e circulação de pessoas, vírus, bactérias e mercadorias.
 
Acho que maior desafio de todos os gestores na atualidade é vencer a guerra contra a Covid-19. Não existia país ou cidade no mundo preparado para lidar com a pandemia. Todos aprenderam a lutar juntos. Nesse sentido, Santos planejou suas ações com cautela, técnica e transparência. Acompanhamos o avanço da doença pelo mundo e tomamos as medidas mais corretas, que comprovadamente eram eficazes. Investimos em equipamentos, ampliamos o número de leitos e contratamos pessoal capacitado para o atendimento. Testamos a população da Cidade e da região numa ação conjunta do Parque Tecnológico de Santos com o Condesb [Conselho de Desenvolvimento da Região Metropolitana da Baixada Santista], sob a atenção de infectologistas renomados da região e universidades. Acompanhamos a evolução da doença e nos preparamos. O resultado de todo esse trabalho, iniciado na gestão do ex-prefeito Paulo Alexandre Barbosa, pode ser visto agora. A Baixada Santista, tendo Santos como protagonista, é a região mais bem avaliada do Estado de São Paulo pelo Plano São Paulo, que estabelece os critérios para o combate à doença e para a retomada das atividades econômicas. Ninguém ficou sem atendimento em Santos. Agora, nesta gestão, compramos insumos, contratamos mais profissionais e nos preparamos para a vacinação dos profissionais da saúde e da população em geral, especialmente dos idosos, que são numerosos em nossa cidade. Estamos em contato permanente com os governos estadual e federal, implementando e discutindo ações preventivas e de imunização. A população de Santos, em sua maioria, e aqui acrescento toda a classe portuária, também tem colaborado e seguido os protocolos de proteção, o que nos auxilia no combate à pandemia e na breve reabertura econômica, que é o que esperamos.
 
Qual sua opinião sobre sustentabilidade e a questão ambiental, considerando que a relação entre Porto e Cidade tem no centro pessoas e natureza? Na sua opinião que vulnerabilidades traz nesse sentido a atividade portuária e como pretendem resolver essa situação? Falando em cuidados ambientais, tem circulado ideais sobre ‘Porto Verde’ e ‘Porto Azul’. Será possível, pensar um Porto com capacidade econômica e com sustentabilidade financeira com benefícios para a sociedade, mas que também pudesse conservar o mar? Esse que traz a beleza e a economia turística, essa que traz também um aporte na microeconomia do município?
 
Santos é uma cidade portuária, mas também é turística. Temos uma praia que é muito requisitada por quem vem nos visitar. É um de nossos cartões postais. Também temos uma extensa área continental - de mata - e mangues, locais muito favoráveis ao desenvolvimento do ecoturismo. Ou seja, a natureza é um dos patrimônios da nossa cidade e é preciso preservá-la. Creio que o investimento no turismo seja uma das formas mais acertadas de conscientizar o público sobre a necessidade da preservação ambiental, além de gerar negócios e renda para a Cidade e seus moradores. Temos investido nisso. No fim do ano passado inauguramos, na Ponta da Praia, o novo Centro de Convenções, que é gerido pela empresa GL Eventos, uma das maiores do mundo na realização de grandes feiras, shows e congressos. Essa empresa veio para Santos por acreditar no potencial que a Cidade e a região possuem para o turismo, especialmente o de negócios. Santos também é reconhecida pela Unesco desde 2015 como Criativa em Cinema. Recebemos filmagens de produções nacionais e internacionais graças à nossa diversidade de cenários, que vai da natureza ao Centro Histórico. Nesse contexto de desenvolvimento dessas potencialidades da Cidade, creio que o porto tem papel muito importante. A solução para conciliar o desenvolvimento e o meio ambiente parte da tomada de ações sustentáveis, que hoje são fundamentais no mundo corporativo. Empresas que se preocupam com o meio ambiente têm seu valor comercial e reputação reconhecidos pelo mercado. Desta forma, creio que o Porto de Santos e as empresas que nele atuam, em parceria com a Cidade, possam desenvolver projetos muito importantes, que unam aumento de desempenho operacional, turismo e preservação ambiental. Todos ganham com isso e o meio ambiente agradece.
 
A melhoria da mobilidade tem tido muito destaque, e dentro dela o debate sobre a ligação seca entre as duas cidades das margens do Porto. Qual a sua opinião sobre a proposta do túnel submerso?
 
Acho que o túnel e a ponte são importantes. Acho que o túnel é uma alternativa urbana, que vai facilitar o tráfego de veículos de passeio não só entre as duas cidades, Santos e Guarujá, mas ligará os litorais sul e norte de São Paulo de forma ágil. O transporte por ferry boat tem se mostrado com limitações diante da nova realidade do trânsito, com o considerável aumento do número de veículos e também a crescente movimentação de pessoas que moram e trabalham em margens opostas. O túnel também é a alternativa para a expansão da linha do VLT para o litoral norte. Já a ponte é uma facilitadora para o tráfego de caminhões no perímetro rodoviário, desafogando o trânsito pesado nas pistas de acesso às cidades e nos municípios. Eu quero o túnel e a ponte, mas isso demanda planejamento envolvendo as necessidades das cidades, a plena manutenção das atividades portuárias e recursos para as obras, que devem vir dos governos estadual e federal. Eu quero as duas alternativas, mas que sejam concretizadas de forma a não atrapalhar o desenvolvimento e a movimentação portuária, mas estimulá-los.
 
Qual a sua posição sobre a desestatização dos portos?
 
A Cidade precisa ter voz no planejamento e gestão do porto, uma vez que a rotina portuária impacta diretamente sobre o dia a dia de Santos. Volto a destacar que é preciso entendimento e colaboração para promover planejamento e desenvolvimento de ações complementares, que tragam benefícios para ambos os lados. Sobre a privatização, é preciso avançar nas discussões para definir a melhor forma para que isso ocorra, sem penalizar o trabalhador portuário e os municípios da Baixada Santista.
 

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