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Desoneração e emprego

Fonte: O Estado de S. Paulo / Celso Ming

Objetivo do ministro Paulo Guedes é aumentar postos de trabalho pela diminuição do custo de mão de obra, mas a cobertura desses benefícios seria repassada por meio de imposto com DNA da extinta CPMF
 
Entre as decisões de grande impacto que o ministro da Economia, Paulo Guedes, pretendia incluir há um mês no pacote do “big bang”, está a desoneração de pelo menos 25% dos encargos sociais que incidem sobre a folha de pagamentos.
 
O objetivo seria aumentar os postos de trabalho pela diminuição do custo da mão de obra para as empresas. A cobertura desses benefícios – entre os quais o da aposentadoria – seria repassada das empresas para toda a sociedade por meio de um imposto sobre transações financeiras, que tem o mesmo DNA da extinta CPMF.
 
Mas, afinal, essa desoneração de 25% garantiria o aumento do emprego no País que hoje tem cerca de 50 milhões de pessoas fora do mercado formal?
 
O professor José Pastore, da Universidade de São Paulo (USP), especialista em Economia do Trabalho, lembra que, em princípio, todo movimento de desoneração ajuda a criar empregos, a aumentar salários e a formalizar contratações do pessoal que se refugia no mercado informal. Mas, hoje, outros fatores parecem ter mais peso: o nível de confiança na política econômica, o uso intensivo de tecnologias que dispensam mão de obra, a desorganização da estrutura tributária e a baixa oferta de crédito para investimentos. Ou seja, as dúvidas são procedentes.
 
Também relevante no longo prazo é o crescente emprego da automação. É recurso que aumenta a eficiência de fábricas inteiras, dispensa, por exemplo, a necessidade de atendentes em agências bancárias e releva o emprego do ascensorista a simples lembrança de tempos menos conectados.
 
O economista e professor da USP Hélio Zylberstajn lembra que a utilização intensiva de tecnologia produz efeito duplo: tanto destrói empregos como abre mercados, que, por sua vez, exigem novas ocupações e nova capacitação da mão de obra para que possa lidar com produtos novos. “A tecnologia tem destruído empregos, mas o efeito líquido é a criação de muito mais”, diz. 
 
E, no caso do Brasil, há tanto a se fazer na infraestrutura, como construção de ferrovias, de terminais portuários, de redes elétricas e sistemas de saneamento, que há espaço para mais empregos. Para ele, o impacto de uma desoneração total sobre o emprego é mínimo. Bastaria o governo reduzir os encargos sobre aqueles que recebem um salário mínimo, de modo a dar ocupação formal aos trabalhadores menos qualificados. E, ao mesmo tempo, promover uma reforma tributária que produza grande impacto positivo sobre o PIB.
 
José Márcio Camargo, professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), levanta outro ponto: se, após a desoneração, fica mais barato empregar um trabalhador, por que, então, o empresário investiria em mais máquinas? Ou seja, a desoneração tende a diminuir o incentivo para a automação e o empresário poderia aumentar a eficiência de sua produção via aumento de salários ou via crescimento do número de funcionários. A desoneração também poderia ajudá-lo a reduzir os preços de modo a garantir participação de mercado num momento, como agora, de baixa demanda.
 
Para o ex-presidente do Tribunal Superior do Trabalho Almir Pazzianotto o maior obstáculo à criação de postos de trabalho é a insegurança jurídica na área trabalhista, e não o alto custo da mão de obra. Entre os maiores fatores de insegurança estão o excesso de processos que vão parar na Justiça do Trabalho e as mudanças de regras do jogo por decisão judicial.
 
Eventual desoneração da folha pode ter pouco ou nenhum efeito sobre a economia, que precisa de outros incentivos para crescer e devolver a confiança aos investidores. Entre eles estão as reformas administrativa e tributária. “O atual alarde em torno da desoneração”, diz Pazzianotto, “lembra o da reforma trabalhista de 2017, que foi tecnicamente bem feita, mas teve efeito muito baixo sobre o desemprego.”
 

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