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Os impactos do acordo global de facilitação do comércio na logística brasileira

Fonte: Portos e Navios / Bayard Umbuzeiro Filho*
 
A melhoria da cadeia logística do comércio exterior do Brasil – para além da atestada necessidade de regulação de seus setores e de vultuosos investimentos em infraestrutura – exige a simplificação, desburocratização e agilização dos processos de liberação das mercadorias em seus portos, aeroportos e fronteiras.
 
Esforços nesse sentido têm sido realizados pelo Poder Público em parceria crescente com os setores privados interessados em impulsionar as trocas comerciais com outros países e ampliar a participação brasileira no comércio mundial, deslocando-a do desprezível patamar atual de 1%.
 
Tais movimentos se traduzem sobretudo na implementação dos programas Portal Único do Comércio Exterior e Operador Econômico Autorizado (OEA), em benefício da cadeia logística de transporte de cargas do comércio exterior, com indiscutíveis  resultados positivos à economia nacional.
 
Mas o que ainda pouca gente sabe é que tanto o Portal Único quanto o programa OEA resultam, no Brasil, de um pacto mundial firmado no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC), em sua IX Conferência Ministerial, realizada em dezembro de 2013, na Indonésia.
 
Esse “Acordo de Facilitação do Comércio (AFC)” entrou em vigor em fevereiro de 2017, quando recebeu a adesão de dois terços dos 162 países-membros da organização, dentre eles o Brasil, que já havia ratificado sua participação um ano antes (em março de 2016).
 
Ele traz, em uma de suas seções, 12 artigos sobre 47 boas práticas a serem implantadas pelo conjunto das nações signatárias, com o claro objetivo de acelerar, desburocratizar e desonerar o comércio internacional, incluindo padronizar processos, reduzir custos logísticos e simplificar a inspeção das cargas de importação e exportação.
 
A OMC estima que a implementação completa do AFC, ainda mais se acompanhada de outros acordos bilaterais e multilaterais de cooperação, poderá acelerar o fluxo do comércio global, aumentando-o em até um trilhão de dólares por ano, além de reduzir os encargos comerciais para os países em até 14,5%.
 
A intenção maior da OMC é aproveitar esse saldo global para gerar novas oportunidades de emprego nos setores de comércio e serviços, de maneira a compensar em parte a restrição nos postos de trabalho prevista pela iminente Quarta Revolução Industrial.
 
No Brasil, o AFC começou a vigorar no ano passado, com a publicação do Decreto 9.326/18. A maioria das 47 recomendações do acordo já havia sido adotada por aqui e seguem sendo aprimoradas. Assim, pelo menos do ponto de vista da logística do comércio exterior, as grandes novidades são, como dissemos, o Portal Único e o Programa OEA.
 
O Portal Único faz uma revisão completa e impõe uma nova dinâmica aos processos de exportação, importação e trânsito aduaneiro, ao reunir, numa única plataforma de TI, a intercomunicação de todos os atores públicos e privados envolvidos com essas atividades.
 
Essa revisão de processos começou pela exportação, com a adoção da Declaração Única de Exportação (DUE) em 2017. Desde então, o número de documentos exigidos diminuiu 85% e o tempo médio de exportação passou de 10 para 6,37 dias, segundo a última estatística da Receita Federal, de dezembro de 2018.
 
Já o novo processo de importação, com base na Declaração Única de Importação (Duimp), está em fase piloto, apenas para operadores autorizados e ainda sem a possibilidade retificação e cancelamento da declaração, devendo funcionar plenamente a partir de 2021. A meta é abreviar o tempo médio de liberação das cargas de 17 para 10 dias e gerar uma economia anual de até R$ 8 bilhões nos custos. Isso significa que alguns elos da cadeia deixarão de faturar esse valor.
 
Também na linha de aprimorar as operações do comércio exterior, em conformidade com o AFC e os critérios internacionais de celeridade e segurança aduaneira, o Brasil adotou o programa OEA, que funciona como um atestado de credibilidade concedido aos agentes da cadeia logística internacional. Uma vez certificados, esses agentes passam a receber tratamento diferenciado das autoridades alfandegárias através do processamento antecipado e da liberação da carga antes mesmo da sua chegada ao país.
 
Conhecido como “despacho sobre águas”, e também recentemente como “despacho sobre nuvens” no caso do modal aeroportuário, esse procedimento vem sendo gradualmente normatizado pelos órgãos anuentes e promete, num futuro não muito distante, se tornar o padrão na liberação de cargas de importação, mesmo pelas empresas não certificadas como OEA.
 
A consolidação desses programas, como resultado das orientações internacionais elencadas no AFC, representa assim um novo paradigma que merece atenção especial: o da velocidade no despacho aduaneiro como novo eixo condutor na logística do comércio exterior.
 
Em vista disso, a ABTRA, como representante de empresas que administram instalações portuárias alfandegadas onde ocorre a liberação de cargas do comércio exterior, está empenhada em discutir a implantação desse acordo mundial, prevendo inclusive novas oportunidades de negócio ao setor e soluções logísticas adequadas aos novos tempos.
 
*Bayard Umbuzeiro Filho é empresário e presidente do Conselho de Administração da Associação Brasileira de Terminais e Recintos Alfandegados (Abtra), que representa as 52 maiores empresas administradoras de recintos alfandegados nos principais estados brasileiros.
 

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