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A complementação da aposentadoria e o direito dos portuários

Fonte: Franzese Advocacia / Cleiton Leal Dias Junior (*)
 
O direito fundamental dos portuários detentores da complementação de aposentadoria de serem tratados com isonomia e respeito 

 
Conforme Acordo Coletivo de Trabalho firmado em 04/10/63 entre o Governo Federal e a Federação Nacional dos Portuários, cujos termos são renovados ano a ano, a “remuneração do portuário inativo integrante de Sindicato filiado a Federação Nacional dos Portuários será complementada de modo a atingir o salário base do portuário na ativa, de igual categoria, acrescido do adicional por tempo de serviço a que fizer jus na data do desligamento.”
 
Essa regra simples deveria assegurar aos portuários que têm direito a complementação, um valor complementar a aposentadoria paga pelo INSS, de forma a atingir o salário do trabalhador em atividade, sempre considerando os reajustes salarias subsequentes, incluindo os planos de cargos e salários, sob pena de malferir o objetivo da norma coletiva que é garantir a isonomia remuneratória entre ativos e inativo.
 
Bem por isso, na década de 90, quando implantado o PUCS (Plano Unificado de Cargos e Salários) os complementados foram convidados pela CODESP a subscrever um “Termo de declaração e expressa concordância” onde a companhia passava a apurar a complementação nos valores daquele plano unificado de cargos e salários, mantendo a tão desejada isonomia garantida no acordo coletivo.
 
Curiosamente, após aquela data, a empresa mudou a postura em detrimento do direito dos complementados, deixando de manter e fiscalizar a aplicação isonômica da norma coletiva. Sobrevieram sucessivos planos de cargos e salários e muitos complementados deixaram de receber o benefício.
 
Considerando a avançada idade dos que possuíam direito a complementação (somente os empregados admitidos até de 04/06/1965), tanto os Sindicatos como a Associação dos Integrantes da Portus deram início a uma longa e extenuante jornada de negociação, para que os complementados voltassem a ter tratamento isonômico em relação aos trabalhadores em atividade, tal como garante a norma coletiva.
 
Os dirigentes sindicais não pouparam esforços, sempre focados na importância de resolver o problema de forma mais rápida possível. A via judicial foi inicialmente descartada, porque os complementados têm idade avançada e não deveriam ser submetidos a processos judiciais, sobretudo considerando que não pleiteiam um “novo direito”, mas apenas a efetivação de um direito antigo, negociado, adquirido e consagrado desde a década de 60 do Século anterior.
 
Imbuídos da certeza de que o problema seria equacionado, o tema passou a fazer parte da rotina e agenda do SINDAPORT, que promoveu reuniões com os interessados, solicitação de pareceres ao departamento jurídico, cobranças sucessivas aos dirigentes da CODESP, assembleias, ofícios e expedientes as autoridades competentes.
 
A diretoria da APP, por sua vez, sempre presente, até diligências ao Distrito Federal realizou, cobrando das autoridades e órgãos governamentais uma solução rápida para o problema.Tais esforços, a par de não resolver o assunto de forma definitiva, resultaram em muitos frutos. Provocado, o Departamento de Coordenação e Governança das Empresas Estatais (DEST), órgão de assistência direta e imediata ao Ministro de Estado do Planejamento, que controla as empresas em que a União, direta ou indiretamente, detém a maioria do capital social com direito a voto, emitiu parecer fundamentado no sentido de que os complementados têm direito de balizar o seu benefício com base no Plano de Cargos e Salários atual.
 
A partir do aval do DEST, algumas das companhias docas, como a CODERJ, de imediato derem início ao reenquadramento por transposição salarial para fins de pagamento da complementação, renovando a esperança dos dirigentes sindicais de nossa região de que a questão estava prestes a ter uma solução definitiva.
 
Infelizmente, os dirigentes da CODESP não promoveram a isonomia devida e esperada, desprezando os seus mais antigos e importantes empregados. Partindo do argumento que o Plano de Cargos e Salários em vigor é “facultativo”, a CODESP não assegurou aos complementados a isonomia devida. Organizados pelas entidades representativas, os beneficiários solicitaram expressamente a transposição salarial, com os dirigentes renovando os pedidos e requerimentos para pronto atendimento do assunto, buscando, enfim, uma solução, que não ocorreu.
 
À guisa de finalizar, é sempre uma tarefa difícil e árdua encontrar o melhor caminho para proporcionar maior efetividade e celeridade ao processo de negociação coletiva. Em quase dois anos de negociação tristemente dezenas de complementados faleceram. Esforços não faltaram por parte dos dirigentes, mas, transcorrido todos os prazos legais e todas as etapas possíveis de negociação coletiva, a CODESP simplesmente não respondeu as centenas de requerimentos formulados, fazendo do episódio o mais significativo desprezo a solução negociada.
 
Para os trabalhadores em atividade, vale lembrar que o direito a complementação de aposentadoria em favor daqueles que ingressaram na CODESP até 04/06/1965 não é diferente de todos os demais direitos previstos nas normas coletivas aos trabalhadores em atividade. A única diferença é que a maior parte dos beneficiados suplantou a sétima década de vida. Com pouca saúde e energia, tais trabalhadores dependem do apoio e amparo da categoria, no sentido de assegurar-lhes proteção para desfrutarem uma velhice digna e tranquila, bem como garantir a observância da sua cidadania e de seus direitos.
 
A administração portuária, como regra, sempre agiu com boa-fé reconhecendo que o sucesso da atividade portuária em Santos sempre foi resultado do esforço dos milhares de trabalhadores que fizeram do Porto local o maior porto de movimentação de carga do país. O tratamento dado aos complementados, entretanto, não seguiu a regra. A busca dos lucros, mesmo em um momento de crise econômica, não pode se sobrepor, juridicamente, à dignidade do trabalhador como pessoa humana e partícipe da obra que encerra o empreendimento econômico.
 
Escoado o prazo concedido para a CODESP demos início a propositura das ações judiciais procurando fazer valer o que esses trabalhadores têm por assegurado na norma coletiva. Caberá ao Poder Judiciário reparar a injustiça enorme a que foram submetidos os mais antigos e zelosos empregados da CODESP.
 
Acreditamos que os magistrados não se furtarão ao restabelecimento imediato da isonomia, restabelecendo a dignidade e respeito que lhes foram furtados pela negligência e inoperância da atual administração portuária.



(*) Cleiton Leal Dias Junior é advogado há mais de 20 anos, pós-graduado latu senso em Direito do Trabalho e Seguridade Social, mestre em direito pela Universidade Católica de Santos, professor titular exercendo a cátedra das cadeiras de Direito do Trabalho e Previdência Social da UNIMONTE (Universidade Monte Serrat) e Subcoordenador da Comissão de Prerrogativas da Ordem dos Advogados do Brasil - Seção de Santos, autor de inúmeros artigos e publicações sobre direito do trabalho e seguridade social.
 

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